segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Outras vozes na cidade

Entrevista concedida à MK. Reproduzido de Vivonacidade


A entrevista a seguir é com Kleber Tobler, militante social do Movimento Passe Livre de Joinville, que no último Grito dos-as Excluídos-as na cidade foi vítima da repressão estatal aos movimentos sociais. Infelizmente não é uma novidade como podemos perceber as ameaças, perseguições, prisões ao MPL-Joinville, aos trabalhadores-as da Cipla-Interfibra, ao movimento estudantil e outros.

A publicação acontece somente agora por conta da audiência que já aconteceu e o Exército resolveu arquivo o processo contra o movimento.

O que levou você a participar do Grito dos Excluídos em Joinville ?

Tobler - Pelo segundo ano consecutivo o Movimento Passe Livre Joinville, do qual eu sou militante, participa do movimento do Grito do Excluídos, que é uma manifestação popular promovido pela Igreja Católica inserida no desfile de independência do Brasil e tem a participação dos movimentos populares, pastorais, entidades, igrejas e movimentos sociais. Para mim e para o MPL Joinville é sempre uma grande satisfação e orgulho participar do Grito, manifestação esta que promove realmente um verdadeiro desfile cívico, no qual se encarrega de levar o caráter popular de manifestação aos brasileiros, comprometido com verdadeira cidadania, fortalecida sempre pela democracia direta. O Grito apesar de ainda ser visto com forte preconceito por setores conservadores tem tido um grande reflexo positivo dentro do desfile de 7 de setembro perante a sociedade. O desfile é sempre carregado de simbolismo e reivindicações populares e tem um forte comprometimento com as causas sociais.

Os poderes constituídos na cidade estão escutando as vozes dos-as excluídos-as ?

Tobler- Sinceramente acho que nem um pouco: os poderes constituídos da cidade de Joinville têm olhado sempre com grande preconceito e indiferença as vozes dos excluídos da cidade. O MPL, outros movimentos e setores populares têm sido perseguido e criminalizado na cidade de Joinville.

O nosso movimento, por exemplo, tem sofrido constante violência e repressão dos poderosos da cidade. Já fomos presos por nos manifestar em diversas ocasiões, perseguidos por grupos monopolistas do transporte coletivo com contratações de gangues e seguranças particulares para nos intimidar e perseguir.

Somos também constantemente criminalizados pela “imprensa marrom” de Joinville que tem se colocado como porta voz de grupos empresariais e políticos da cidade de Joinville.

O prefeito em exercício tem demonstrado em anos de governo um modo de governar, no mínimo, “fascistóide”, pois se alia à máfia empresarial local e a politicagem corrupta da cidade contra as vozes que lutam contra as injustiças sociais e tem usado de todos os poderes em mão para destruir e criminalizar os movimentos sociais da cidade.

A ditadura militar brasileira (1964-85) perseguia, prendia, torturava e até matava seus-uas opositores-as. Hoje ainda sofremos com as permanências esse nefasto momento da história recente do Brasil ?

Tobler- Atrevo-me a dizer que a ditadura não acabou definitivamente com a dita redemocratização do país.

Lembre dos exemplos que dei somente com o MPL Joinvile, um movimento que tem apenas três anos de atuação e militância e já foi diversas vezes perseguido e criminalizado com táticas que lembram seguramente os tempos ditatoriais.

O estado de direito que temos hoje é constituído por muitos do que mataram pessoas e destruíram a democracia brasileira.

Quer exemplos do que falo? A policia militar do mesmo período permanece até hoje com a mesma estrutura e cultura militar; o serviço de inteligência da antiga SNI só mudou o nome, continua com as mesmas táticas dos seus tempos criminosos de perseguição e espionagem, e tem vários espiões do período trabalhando dentro da agência.

O congresso nacional é repleto destes meliantes políticos da ditadura, o poder como um todo em diversos setores também tem cadeiras ocupadas por estes criminosos de guerra.

Os militares que perseguiram, mataram e estupraram seus opositores estão livres e impunes levando a vida normalmente, vivendo muito bem do dinheiro do povo que perseguiu.

Temos um exercito que é um verdadeiro cão de guarda dos poderosos nacionais e do capital internacional.

Mentira? Quando há uma ocupação de terra pelo MST lá está a policia militar ou o próprio exército armado até os dentes para proteger os “indefesos” latifundiários de terra.
Quando a cidade de Florianópolis foi tomada por uma multidão contra o aumento das passagens lá estava a polícia militar com todo seu aparato de repressão contra o povo e protegendo os terminais monopolizados pela máfia do transporte. Depois de uma verdadeira revolta popular os poderosos colocaram na cidade de Florianópolis um escritório da ABIN para vigiar a cidade insurgente.

Acho que se ficar listando há inúmeros casos a levantar, fico por aqui. E digo seguramente que estamos longe de um estado democrático verdadeiro, comprometido com seu povo bem como sua soberania.

No domingo (07 de setembro de 2008) foi preso o KT ou um movimento social, numa outra tentativa do Estado de criminalizar os movimentos sociais ?

Tobler- No domingo mais que um militante do Movimento Passe Livre foi preso um corpo simbólico dos movimentos sociais, manifestando ali dentro do Grito dos Excluídos em busca do direito à vida e o respeito pelos direitos humanos. Infelizmente mais uma vez foi coagido e calado pela força e a intolerância do Estado falsamente democrático.

Em relação à criminalização, quais são os próximos passos que você espera dos movimentos sociais da cidade ?

Tobler- Espero mais aproximação dos diversos movimentos sociais e políticos da cidade. Vejo que estamos infelizmente altamente fragmentados, cada um mais preocupada com bandeiras e ideologias do que a construção de um novo paradigma político e uma nova sociedade. Infelizmente fiquei muito triste por ver que muitos setores da dita esquerda me criticaram ou me deram as costas em um momento em que eu precisava de solidariedade.

Quais as razões para buscar a intervenção artística caracterizado de um militar de formas demoníacas?

Tobler_ Como o próprio grito que se manifesta e carrega forte simbolismo, tentei me manifestar de forma lúdica e artística para mostrar o horror das perseguições e torturas dos militares, com a intenção de fortalecer o assunto na sociedade sobre a lei de anistia. A idéia era usar a farda militar como fantasia, usando no rosto uma máscara de demônio como personificação máxima da maldade dentro de nossa visão cultural religiosa brasileira. Vestido desta forma desfilaria na avenida carregando simbolicamente atados pela mão e pela boca três prisioneiros de guerra. Esta era a idéia a principio, que não se realizou pela truculência dos policiais, a mando dos soldados do exército.

Manifestar-se de forma lúdica sempre foi um traço muito forte em nosso movimento o MPL Joinville. Achamos nesta forma de expressão um canal poderoso de comunicação com a sociedade, principalmente para os mais jovens que geralmente simpatizam com esta forma de expressão e comunicação.

Como o próprio movimento é juvenil e do movimento estudantil nos manifestamos sempre longe dos tipos tradicionais de manifestação da esquerda, que a nosso ver já estão superadas e vistas com apatia pela nova conjuntura social brasileira.

Levar um caminhão de som subir lá em cima e se comunicar aos berros fazendo cara feia é algo do passado e esgotado como forma de comunicar-se com as massas para nosso movimento.

Nossa intervenção política não deixou de lado o megafone e nem abandonou o diálogo, mas acrescentou a este uma forma alegre e descontraída de se manifestar através do ludismo artístico.

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